Introdução
Reivindicamos o espaço discursivo da Bruxa como um local útil para construir conexões miceliais de solidariedade e resistência, para imaginar novas formas de ser e para manifestar as nossas descobertas e criações com atenção específica ao desmantelamento de sistemas de opressão.
—Manifesto do Coven BioArt
A vida lunar está em oposição direta ao capitalismo e ao tempo linear.
Este é um livro sobre as ferramentas da magia. Mas não é um guia prático, nem uma lista de coisas que você precisa comprar para ser uma Bruxa. Pegamos nossas ferramentas, viramos-as para a luz e pensamos sobre o que realmente usamos para fazer mágica em nossas vidas. O que usamos para criar futuros possíveis? O que realmente funciona?
As ferramentas materiais e estéticas da magia são vendidas em mais lugares do que nunca. A bruxaria é uma indústria multibilionária. Você pode conseguir cristais, varinhas e poções feitas por crianças e entregues por drones, mas não é necessário. Você pode apoiar os artesãos locais e comprar apenas pedras extraídas de mina honesta, mas isso também pressupõe privilégio. Este livro foi escrito para lembrar a todos nós que temos identidades e poder além do consumo. Não precisamos comprar nada para nos conectarmos com nossa própria magia fenomenal. Essas ferramentas são o direito inato da nossa humanidade.
As pedras comuns que você vê na rua ou desenterra no seu quintal, aquelas caídas nas margens dos rios ou nas praias, ou espalhadas como se uma mão gigante as tivesse jogado no campo, são dotadas de poderes.”1
Acreditamos que os espelhos do nosso banheiro são tão proféticos quanto qualquer bola de cristal. Poças de lama guardam sussurros do oceano. Uma vela de aniversário fala a linguagem dos primeiros incêndios. O céu é seu para ser visto de graça. Este clube não cobra couvert e todas as nossas pedras têm alma.
Você pode usar ferramentas que já possui – ferramentas que são tanto materiais quanto conceituais – para perturbar a forma como o capitalismo coopta tanto a magia quanto o artesanato. Silvia Federici afirma que “o renascimento das crenças mágicas é possível hoje porque não representa mais uma ameaça social”.2O capitalismo está muito feliz por a nossa elaboração do mundo se tornar mais um sabor do mês, mais uma ilusão de escolha; feliz em nos vender outro horóscopo enquanto a máquina dobra nossos corpos repetidas vezes para seu trabalho. Mas, numa citação à qual sempre voltamos, Federici também nos devolve esta esperança:
A própria sensação de que vivemos à beira do vulcão torna ainda mais crucial reconhecer que, no meio da destruição, um outro mundo está a crescer, como a relva na calçada urbana, desafiando a hegemonia do capital e do Estado e afirmando a nossa interdependência e capacidade de cooperação. . . . Este é o horizonte que o discurso e a política dos comuns nos abrem hoje, não a promessa de um regresso impossível ao passado, mas a possibilidade de recuperar o poder de decidir colectivamente o nosso destino nesta terra. Isso é o que chamo de reencantar o mundo.3
E portanto este é um livro de ferramentas para decidirmos coletivamente o nosso destino. Este é um livro de feitiços cheio de instrumentos para tortura espiritual. Este é um grimório para o nosso reencantamento coletivo.
Número de páginas | 223 |
Edição | 1 (2023) |
Idioma | Português |
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