Em O último voo, Waldomiro Manfroi insere o leitor em uma típica roda de conversas à beira-mar, em uma praia como tantas outras do sul do Brasil. No centro da roda, encontra-se Artur, um homem profissionalmente realizado e que, chegando à maturidade, decide deixar a cidade grande para trás e fixar-se no litoral. Instado pelos amigos que o cercam a relatar uma traumática experiência de violência urbana pela qual passou e sobre a qual jamais falou abertamente, Artur enfim cede ao desafio de reviver aquele episódio que, em vários sentidos, condicionou (e, até mesmo, limitou) os seus percursos dali por diante; contudo, para fazê-lo, Artur precisará interconectar diversos outros episódios e relações, bem como trazer à cena personagens com quem cruzou em seus caminhos de vida – o enfermo Rogério, o Otimista, o Aventureiro, o Professor –, utilizando-as como caixas de ressonância para suas próprias ideias, medos e anseios. É como se, para Artur, tudo o que ele carrega dentro de si, adensado e reforçado por anos de opressão, não coubesse na história de uma única pessoa. “Estou curioso para ver o que o amigo Artur é capaz de escrever”, diz-lhe, em certo ponto da trama, o Professor, aconselhando-o a abraçar a literatura como forma de expressão, a palavra como último refúgio e boia de salvação. Desse modo, borrando as fronteiras entre a narrativa oral e a escrita, entre primeira e terceira pessoas, entre realidade e ficção, Waldomiro Manfroi nos conduz ao derradeiro voo deste seu protagonista, para quem nada do que é humano resta à margem.
Rafael Bán Jacobsen
Da Academia Rio-Grandense de letras
Cadeira 29
Número de páginas | 100 |
Edição | 1 (2023) |
Idioma | Português |
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