Eurídice é o nosso planeta desértico, habitado por algumas centenas de espécies nativas, a superfície coberta em sua maior parte por dunas de areia, fendas, rochedos estéreis e algumas porções de gelo e mares rasos na altura dos pólos.
Já Orfeu é quase todo coberto pelos oceanos. Do pouco que é oficialmente sabido, as ilhas mais baixas são completamente nuas e as áreas continentais possuem os picos mais elevados de todo o sistema solar. Ora, sendo a água vital à sobrevivência, não foi estranho terem relegado Orfeu a um segundo plano? Alguns figurões da Colombo tacharam-no de santuário. Justificaram que Orfeu abrigava formas de vida muito raras, peculiares e sensíveis à interferência externa. Em vez de nos contaminarem, nós é que poderíamos contaminá-las. Poder-se-ia dizer tratar-se de um argumento razoável, uma lição aprendida a duras penas depois de tudo o que a humanidade fizera na Terra. Seria assim, caso não soubéssemos serem essas características excepcionalmente raras diante do padrão geral do ser humano e dos políticos em particular. Ademais, a sobrevivência da espécie humana encontrava-se em jogo! Desde quando nos preocupamos com outras espécies? Olhe o que fizemos na Terra! Orfeu era a escolha óbvia. Eurídice, face aos monstros sazonais, inviabilizou a utilização das Cidades-do-Céu. Sua escassez de água levou-nos ao selecionamento genético e à rigidez no controle dos seriados.
A curiosidade humana sempre foi um dos instintos mais aguçados e, de resto, impulsionou-nos às estrelas. Não estirparam isso durante a manipulação dos genes. Qualquer "mãe" que se preze sabe que dizer a uma criança para não fazer tal coisa é o mesmo que estimulá-la a fazê-la. E o que são os adultos senão o lado mais estúpido e perigoso de uma criança?
Havia pessoas dispostas e poderosas a pagar grandes somas por amostras diversas de Orfeu: empresários, industriais, até cientistas.
Animais raros - vivos ou mortos - representavam muitos créditos para os aventureiros, oferecidos por colecionadores particulares, museus sem escrúpulos, pesquisadores farmacológicos e outros. Queriam saber quais aplicações teriam as diferentes substâncias obtidas de Orfeu e os lucros potenciais envolvidos. Nem estou falando dos minérios e daquilo que é mais óbvio e valioso: a água.
Homens rudes aceitaram o desafio principalmente pelo valor que iriam receber. Motivações secundárias foram o prazer de explorar um ambiente estranho, o prestígio que conquistariam no submundo da clandestinidade e a satisfação inerente a todo contraventor: burlar as normas e as autoridades.
Naves foram construídas ou roubadas.
A distância entre os planetas foi percorrida.
Como sabemos, nenhum dos primeiros aventureiros retornou.
Durante a quarta geração de exploradores ilegais, uma mensagem em código foi interceptada de Orfeu por um sujeito especializado em criptografia. A custo, decifrou a mensagem. O que ela dizia? O caçador em questão mencionava ter avistado criaturas imensas, pavorosas - pesadelos ambulantes foram suas palavras -, todavia, apesar do aspecto, mostraram-se tímidas. Não anexou uma imagem e tampouco preocupou-se na descrição. Era um bruto e não um orador. A última informação dava conta dele estar partindo no encalço de uma delas. Nunca mais deu notícia.
A menção a pesadelos ambulantes deveria inibir novas tentativas, não obstante, estimularam-nas.
Homens corajosos e imprudentes viram-se, agora, diante de um verdadeiro e maior desafio.
Número de páginas | 326 |
Edição | 1 (2019) |
Formato | Pocket (105x148) |
Acabamento | Brochura s/ orelha |
Coloração | Preto e branco |
Tipo de papel | Offset 80g |
Idioma | Português |
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